quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

" Flora, a vilã que amamos odiar"


Li o artigo do Arnaldo Jabor entitulado: "Flora, a vilã que amamos odiar" . E queria compartilhá-lo com quem virou fã e está apreciando a magistral interpretação da vilã mau caráter folhetinesca vivida pela atriz Patrícia Pillar na novela "A favorita" da Rede Globo.
Segue abaixo o principais trechos da crônica do Jabor:
"A extrema maldade de Flora da novela "A Favorita" nos faz indignados e fascinados. Patrícia Pillar está dando um show, como também Glória Pires fez no passado com Maria de Fátima em "Vale Tudo", que iniciou a leitura da psicopatia brasileira. Antigamente, nos romances e filmes, nos identificávamos com as vítimas; hoje, nos fascinamos com os vilões. Por quê? Bem, porque os psicopatas são o nosso futuro, a vida moderna nos levará a isso.Diante dos cadáveres, da miséria, do cinismo, somos levados a endurecer o coração, endurecer os olhos, a ser cínico em busca de um funcionamento "comercial". Do contrário, seremos descartados, tirados "de linha" como um carro velho.O psicopata light, que não faz picadinho de ninguém, tem as mesmas molas que movem o esquartejador. Tem encanto e inteligência; sem afetividade ou culpa para atrapalhar, tem uma espantosa capacidade de manipulação dos outros, pela mentira, sedução e, se precisar, pela chantagem. Questionado ou flagrado, o psicopata sempre se acha inocente ou "vítima" do mundo, do qual tem de se vingar. Suas ações mais absurdas e cruéis são justificadas como lógicas, naturais, já que o "outro" não existe. Não sente nem remorso nem vergonha do que faz. Ele mente compulsivamente. Não olha para dentro de si simplesmente porque acha que não tem nada a aprender.O psicopata não deprime. Ele atua e pode fazer muito sucesso num mundo onde a alegria falsa e maníaca é obrigatória. Estes tempos de alegria obrigatória são "sopa no mel" para os psicopatas, os chamados psicóticos "sãos" como os nomeiam alguns psicanalistas hoje.Hoje em dia é proibido sofrer. Temos de "funcionar", temos de rir, de gozar, de ser belos, magros, chiques, tesudos, em suma, temos de ser uma mímica dos produtos de "qualidade total".No entanto, a depressão importa. A melancolia é fundamental para a criação e para a felicidade. Estamos erradicando uma força cultural brutal, a musa por trás de muita arte, poesia e música. Estamos aniquilando a melancolia.Sem um desencanto com o sentido da vida, sem um ceticismo crítico, sem a morte no pensamento, ninguém chega a uma reflexão decente. Só com a ajuda da angustia constante este mundo à beira da morte pode ser transformado, reavivado, levado ao novo.No Brasil, com a crise das utopias e com a propaganda estimulando a ridícula liberdade para irrelevâncias, temos o indivíduo absolutamente sozinho. Isso leva a um narcisismo desabrido, base da psicopatia. Queremos ser ricos ou famosos.E esse comportamento está deixando de ser uma exceção. O psicopata é um prenúncio do futuro. A velha luta pela ética, pela paz, pela solidariedade está virando uma batalha vã. Os chamados comportamentos "humanos" estão se esvaindo na distância. O "humano" está virando apenas um lugar-comum para uma "bondadezinha" submissa, politicamente correta.Antes, os psicopatas tocavam num mistério que não queríamos conhecer. Tínhamos medo deles. Hoje, temos de competir com os psicopatas, que em geral nos vencem, com sua eficiência, rapidez e falta de escrúpulos. Estamos vendo que essa antiga doença vai acabar virando uma "virtude" no futuro."
(Arnaldo Jabor)

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